O melhor remédio para curar pudores e pruridos é lidar com miúdos. No mundo
xs não há cá subtilezas nem meias palavras. Não sabem o que é politicamente
correto e se lhes parece, dizem-no. Alguém com flatulência é impiedosamente apontado e um coletivo de
bufos há-de gritar indignadamente: "Ticher, o Afonso peidou-se"; os
bufos mais sensíveis dirão "O Afonso deu um pum!" e os engraxadores aproveitarão para perguntar como se diz "pum" em inglês", mas ninguém vai fingir
que cheira a rosas. Um elefante no meio da sala nunca é ignorado. E se o elefante for o
tamanho avantajado ou diminuto da professora, a cor de pele ou do cabelo ou
seja lá o que for que fuja do habitual, os miúdos vão comentar. Não é por mal,
nem por bem. É assim mesmo. Se não estás preparada para lidar com isso é melhor
pensares noutra profissão.
Tens um canino mais saliente? “Oh, a ticher parece um vampire”; Descuidaste a pintura do cabelo? Vão ser muitos a
lembrar-to: “Tens cabelos brancos. Pareces a minha avó.”
Uma tarde vou de cara
lavada e logo um pergunta: “Acordaste agora, não foi ticher?” ou então ainda pior “Estás com ar doente”; noutra ocasião,
tendo eu eructado discretamente, diz-me um sorridente “Comeste bifanas ao
almoço!”. “Não. Porque dizes isso?” “Cheirou-me!” Até fiquei com azia!
E quando
uma aluna perguntou se ia ter bebé? Fiquei de todas as cores e, claro, bani
para sempre aquele top justinho que eu achava que me ficava tão bem. Há dias,
após um comentário sobre alturas, levanta-se um e vem medir-se em relação a
mim. Triunfante, exclama: “Olha, já chego às mamas da ticher”; logo outro quer medir-se também, e às tantas tinha um
bando de miúdos à minha volta a ver se já me chegavam ao peito e a repetir
esganiçadamente as suas alturas tendo como referência... “as mamas da ticher”. Se isto não é dar o corpo à
docência não sei o que será.