No cantinho das memórias nostálgicas da escola primária habitam os piolhos. Não há quem não tenha uma história para contar. Ou porque teve muitos, ou porque escapou incólume ou porque a respetiva mãe conhecia uma mezinha infalível para acabar com a praga. Mas as histórias conjugam-se sempre no passado. Acabamos por crescer e esquecê-los. Virtualmente extintos nas nossas cabeças passaram a ser uma espécie de mito urbano na cabeça dos outros. Ou dos muito velhos ou dos muito sujos. Até que voltamos à escola. E um dia dizem-nos, baixando a voz e olhando em redor: “Professora, devia apanhar os cabelos. Anda aí praga.” Inquiro: “Praga de quê?”; Sussurram: “Piolhos!”. Seria possível? Praga de piolhos numa escola, no século XXI?! Agradeci a informação mas no íntimo achei que seria alarmismo. Habituada aos abraços e mimos dos miúdos continuei como se nada fosse. E o cabelo continuou solto. Seria o risco suficiente para me fazer prescindir da vaidade? Achei que não. Indaguei entre as professoras e houve quem me asseverasse que nos cabelos pintados os piolhos não entram. Alívio. A auxiliar diz-me para não me fiar nisso. “Vinagre, professora. Tem de pôr vinagre após o champô.” E fala-me dos “lavagantes” que apanhou numa cabeleira infantil. Sugestionada começo a sentir comichões e a retrair-me ao contacto com as cabecitas infestadas. Em vão. Aferrada à ideia da tinta protetora recuso-me a considerar a hipótese de ter piolhos. Mas o inconsciente não tem pruridos e chego a ter pesadelos onde vejo colónias de parasitas a pulular no meu couro cabeludo. Acordada, a coceira também continua e acabo por pedir à minha mãe que me veja a cabeça... É então que me atinge o significado das palavras do cabeleireiro: “Só trabalhamos com a ‘Lupa Biológica’, tintas amigas dos animais!”.
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